10 janeiro 2006

Entrevista realizada para mobilizadores COEP

A caminho da responsabilidade social empresarial
Data: 09/01/2006
Nessa entrevista, a mobilizadora Eliane M. Mota Fukunaga, que atua como consultora de Responsabilidade Social, nos conta um pouco de sua experiência na área e faz uma análise sobre a atuação social das empresas e os desafios para que um maior número de empresas passe a conduzir seus negócios seguindo preceitos éticos e de compromisso social. Ela é administradora de empresas e Auditora Líder em SA8000 pelo SAI (Social International Accontability – EUA). Atua na elaboração de balanços sociais e diagnóstico de responsabilidade social. Desde 2003 realiza trabalho voluntário em Escolas Estaduais e Municipais da periferia de Campinas.

Mobilizadores COEP - Há quanto tempo você atua como consultora na área de Responsabilidade Social? Conte-nos um pouco sobre o trabalho que realiza, o tipo de empresa que atende.
R. Comecei por atuar no terceiro setor, em 1999. Mais tarde, decidi seguir o caminho das empresas. Efetivamente, desde 2002 atuo com responsabilidade social, em empresas privadas que buscam desenvolver novos paradigmas. Empresas que perceberam a necessidade de mudar e viram na responsabilidade social uma porta de entrada para pensar a empresa de um novo modo. Como fazemos isso? Depende do que se quer. Se a empresa está em busca de uma certificação, o caminho é a SA8000. Porém, se a empresa quer pensar em responsabilidade social como um projeto social, fazemos o diagnóstico da vocação da organização e elaboramos projetos sociais com alianças intersetoriais, ou não. Outras empresas querem apenas ter uma avaliação de como estão e o que podem começar a fazer. Assim, realizamos um diagnóstico de como a organização está, quais os pontos mais urgentes de melhoria, elaboramos sugestões de mudanças em parceria com a organização e, semestralmente ou anualmente, realizamos o mesmo diagnóstico. As empresas que atendemos são diversas, tanto em setor de atuação, quanto em tamanho.

Mobilizadores COEP - O movimento da responsabilidade social empresarial começou a crescer no Brasil no final da década de 1990. Na sua avaliação, como tem se modificado o envolvimento das empresas na área social?
R. Aproveito para salientar que este movimento surgiu antes com empresas que trabalhavam nessa direção, mas numa época que não se tinha um conceito definido; o exemplo disso é a Azaléia. O movimento de responsabilidade social tem evoluído de modo bastante diverso, o que permite encontrarmos hoje empresas que atuam em diversos estágios da responsabilidade social. O que quero dizer com isso é que encontramos empresas que atuam em ações sociais, outras que criaram mecanismos para projetos próprios, outras ainda que avançaram no que se refere ao tema voluntariado, outras que incorporam normas, como a SA8000, e ainda há um bloco pequeno de empresas que incorporaram a responsabilidade social na sua estratégia, o que leva ao conceito de sustentabilidade não só ambiental, mas do negócio, com uma visão “holística” da organização. Acredito que ainda falta no Brasil capilaridade, ou seja, uma estrutura de divulgação da responsabilidade social mais ágil e acessível para que esta visão seja mais bem compreendida e assimilada.

Mobilizadores COEP - O que você acredita que seria necessário para que um maior número de empresas passasse a gerir seus negócios segundo os princípios éticos e de responsabilidade social?
R. Apesar de muitas pessoas e empresários discordarem do que vou colocar aqui, creio que o melhor caminho é criar mecanismos que promovam o controle e a mensuração disto dentro da organização. Primeiramente as empresas existem antes de conceitos, portanto o fato de ser benéfico não significa que isto seja simples e fácil de se agregar, pois estamos lidando com fatores muito subjetivos que impedem a adoção rápida e indolor (porque mudar dói, seja você empresa ou ser humano) de uma nova visão da organização e dos próprios empresários. “Cultura da organização”, métodos de compras, mecanismos de vendas, trabalhadores, visão dos fornecedores, tudo isso necessita ser repensado dentro de um modelo de responsabilidade social e deve ser avaliado dentro de planos de ação. Outro ponto é o planejamento. Responsabilidade social gera custos que precisam ser avaliados e pensados para resultados em longo prazo. Apesar de se ter resultados visíveis em produtividade e clima organizacional, o grande resultado é a sustentabilidade da organização, da marca e a credibilidade que se transporta para muitos aspectos. Outro ponto que gostaria de levantar, e que é minha tese de mestrado, é a SA8000. Esta pode representar um grande passo para a responsabilidade social, do ponto de vista interno, e fomenta uma mudança de visão organizacional muito forte, pois trata de aspectos como fornecedores, funcionários e sindicatos, que para muitas empresas são difíceis de lidar. Além do que, a SA8000, por trazer um modelo de norma, é de fácil aplicação e controle para melhoria e mensuração de tais aspectos. Responsabilidade social não deve ser algo que seja visto como inovação, como valor agregado, mas uma necessidade premente para a organização, o negócio e a marca futuramente existirem. Antes de tudo o que já disse, as empresas precisam avaliar seus canais de comunicação, interna e externa, e fotografar, por meio de um diagnóstico, como está o seu estágio hoje em responsabilidade social. Mas fundamental mesmo é que isto parta da alta direção da organização.

Mobilizadores COEP - Você acha que o consumidor tem um papel importante para levar as empresas a adotarem práticas socialmente responsáveis? Por quê?
R. Sim, sem dúvida o papel do consumidor é muito importante para a mudança das posturas sociais e éticas das organizações. O consumidor, possuindo renda e informação, pode optar por produtos de empresas que respeitem os trabalhadores, que não soneguem impostos, respeitem o meio ambiente e proporcionem possibilidade de gerar renda para populações que vivem da produção de matérias-primas. O consumidor pode, e deve, denunciar irregularidades não só do produto, mas do modo como são produzidos, como a empresa age e onde está instalada, com relação a resíduos e à comunidade do entorno.

Mobilizadores COEP - Quais os principais desafios que, a seu ver, o movimento da responsabilidade social empresarial tem a enfrentar em nosso país?
R. Os desafios são tantos! Mas, como otimista que sou, acho que estamos superando, pouco a pouco, cada um deles. O maior desafio é que as empresas estão sendo responsabilizadas por mudanças internas e externas, ou seja, de toda a sua cadeia de valor. Isto interfere no modo como se pensa o lucro, ou seja, a curto ou a longo prazo. Outro fator é que muitas empresas, pequenas e médias, acham que isso é para grandes empresas, o que não é verdade. Porém, percebo que, do ponto de vista do governo, a responsabilidade social passa ao largo. Isto é um alerta para a necessidade de ocorrência de mudanças nas políticas de privatizações e concessões de isenções fiscais para empresas que, de algum modo, buscam reduzir determinados custos, sem contrapartidas sociais e ambientais. O olhar do governo para o setor privado deve ser de legislar e privilegiar empresas responsáveis socialmente, ou seja, começar a pensar em políticas de responsabilidade social, como ocorrem em países como Canadá, Reino Unido, entre outros. Isto promoveria uma mudança, pois serviria como um impulsionador para o avanço socioeconômico do mercado como um todo. Outro desafio é a capilarizaração dos meios para divulgação e conscientização do que a responsabilidade social pode fazer pela empresa, pelos funcionários, pela comunidade e pelo próprio governo. Financiamentos em determinadas instituições financeiras já estão sendo avaliados do ponto de vista de sustentabilidade, por que não pensar em políticas com este mesmo foco?

Mobilizadores COEP - O que a levou a criar um blog sobre responsabilidade social e quais os assuntos que costuma abordar?
R. O que levou a criação do blog foi a possibilidade de poder colocar conceitos que venho desenvolvendo e poder mobilizar opiniões acerca do tema. O blog é um mecanismo de comunicação interessante, de fácil interação e coloquei-o à disposição para que pessoas debatessem temas, tirassem dúvidas, iniciassem projetos e, juntos, púdessemos construir novas opiniões. Com certeza tenho interesse na divulgação e quero que muitas pessoas se tornem membros dessa comunidade com muita vontade de contribuir com as discussões. Vejo que a população e as comunidades devem atuar de modo mais participativo, por isso o blog é acessível, gratuito e permite intervenções. Os temas que apresento são experiências de trabalhos realizados em empresas, por meio de consultoria e de acordo com os resultados obtidos.

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